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Petrus, o Vinho que Antes de Ser Lançado Já Está Vendido 99%

Um verdadeiro sonho de qualquer produtor vitivinícola é chegar ao status do vinho que antes de chegar ao mercado se encontra 99% do vinho vendido e já esgotado as suas vendas, pois o 1% restante fica a cargo da reserva da família. Este fenômeno por vezes é difícil explicar de forma simples e prática aos comuns consumidores vínicos “os tidos como meros mortais”, que ficam incrédulos com estes feitos. E vale lembrar que estamos falando de uma marca de vinho com um dos mais valiosos valores agregados deste setor econômico que movimenta bilhões de dólares em todo o mundo. Mas afinal o que leva um vinho a ganhar este prestígio e poder cobrar estes valores agregados tão valiosos? Tentarei de forma sucinta levantar algumas razões com este artigo.

Interessante primeiramente compartilhar de forma resumida a história desta lenda vínica que iniciou no século XIX, e ganhou a sua primeira medalha de ouro no Concurso Internacional de Paris em 1878. As safras de 1945 e 1947 tornaram-se ícones e marcaram o início da fama glamurosa até a atualidade desde brilhante néctar de Baco. Este carrega segredos muito além da produção de um líquido elaborado a perfeição absoluta. Na atualidade os seus proprietários são Jean-François Moueix, o herdeiro e que é o atual presidente da empresa, e 20% do capital foi vendido ao Alejandro Santo Domingo, um investidor colombiano e também proprietário da cervejaria Bavaria. Especula-se que está parte da empresa foi arrematada por 200 milhões US$. Mas esse número pode estar subestimado.

Suas garrafas mais prestigiosas e procuradas no mercado pelos colecionadores e investidores são as fabulosas safras de 1929, 1945, 1947, 1961, 1964, 1982, 1989, 1990, 2000, 2005, 2009 e 2010.

por Dayane Casal, Paris – 2023

Como todo bom enólogo a explicação de poder fazer um bom vinho está na vinha, e alguns humildemente ainda comentam que se o enólogo não estragar a uva, o vinho será bem produzido. Mas no caso do Petrus além de ter em sua história de produção de matéria-prima fenomenal, possui profissionais da mais alta competência no decorrer do processo, como o prestigioso enólogo francês Jean-Claude Berrouet, que trabalhou por 44 anos para o Petrus. No ano de 2008 o seu filho Olivier Berrouet, que na ocasião tinha 33 anos, veio a substituiu o seu pai como enólogo e diretor do Petrus, ficando assim bem encaminhado a continuação da busca pela excelência quanto ao fator humano.

Mas o contexto do conceito terroir abrange diversos outros fatores aos quais podemos observar que os 11,5 ha são 100% cultivados com a casta Merlot, num solo de característica muito peculiar que o distingue da maioria da região onde predominam calcários. O solo localizado nos vinhedos do Château Petrus são em maioria argilosos de cor escura, com presença significativa do mineral ferro, possui boa compactação, e apresenta um perfil de não reter tanta água e ter excelente drenagem. O clima da região é marítimo moderado e recebe benefícios da corrente do Golfo, os vinhedos do Château estão inseridos na AOC Pomerol, na margem direita do rio, onde predomina um clima ameno e moderado pelas massas de água. Aqui em solos mais frios e sob rigoroso controle na produtividade dos vinhedos, busca-se concentrar ao máximo a qualidade da matéria-prima, grau alcoólico desejado, taninos maduros, boa acidez e os precursores aromáticos e de sabor, tudo de forma equilibrada. Nestas condições a Merlot consegue atingir o nível de maturação excelente produzindo vinhos com muito corpo e maduro, com uma capacidade de longevidade incrível.

Para a construção de uma imagem e valor de uma marca é necessário ir muito além de ter uma elegante logomarca, um bonito rótulo, uma requintada apresentação e um storytelling . É necessário traçar estratégicas comerciais e que posicionem a marca no setor do mercado ao qual está se focando, no caso do Petrus, o mercado de luxo. Claro que no século XIX o Château Petrus não conseguia vender seus vinhos como são vendidos na atualidade, pois isto custou além de gigantescos investimentos em diversos aspectos econômicos e de trabalho consistente, custou muito tempo. E se mostrar como uma imagem qualitativa de excelência e de forma linear ao longo de sua história tem um peso gigantesco, que podemos sintetizar com uma frase popular “para fatos não há argumentos”. Obter 99% do vinho vendido ao preço que são leiloados, antes de serem lançados, este é um fato indiscutível e incontestável de sucesso de construção de uma prestigiosa marca vínica.

Quando se foca no mercado de luxo, não basta só o preço ser elevado, tem que saber trabalhar e conversar com o seu nicho específico de clientes. Em setores econômicos diferentes ao do vinho, mas ao qual o foco é o nicho do luxo, você não vê ações de propaganda em meios de publicidade focados na massa da população, ou até na utilização de pessoas desqualificadas para participarem das estratégias de branding das suas marcas. Bons exemplos são a marca Maserati de carros, a marca Patek Philippe de relógios e a marca Tiffany de joias, essas empresas focam no seu público alvo e fazem questão de também ter como parte da estratégia de posicionamento de mercado possuirem peças inacessíveis a população normal, gerando confiança no seu cliente, status no seu nicho e simbolizando que quem as possui está num outro patamar de entendimento do que é VALOR, e não no que é PREÇO.

No caso do Petrus este trabalho vem sendo realizado já há bastante tempo. O mercado americano se destacou com os magnatas milionários e quando virou um vinho de escolha em momentos especiais da família Kennedy. O mercado asiático também teve um importante papel na consolidação do posicionamento da marca, onde o vinho estava presente em mesas de grandes empresários selando contratos multi-milionários. E claro que em toda a parte do mundo onde o vinho é consumido e que possui esse tipo de cliente faz parte do ecossistema de valor criado.

Os leilões do vinho Petrus são aguardados de forma ansiosa pelos grandes investidores deste setor, arrematar lotes de garrafas com a marca Petrus significa investimento com lucratividade garantida. Algo curioso em partilhar sobre construção de imagem de marca foi uma garrafa de Petrus da safra 2000 ter ido estagiar por 14 meses em órbita, isto ocorreu em 2019 e em outubro de 2021 esta foi arrematada pelo valor de 1 milhão de dólares, num leilão organizado por uma das casas de leilões mais prestigiosas do mundo, a Christie’s, evidenciando o poder do ecossistema de investimento de marca também.

Além da excelência primorosa na qualidade excepcional do líquido vínico que a garrafa do Petrus embala, há muito mais de branding de luxo e história bonita contada. Há um status social que posiciona o seu produto no mercado de marcas de luxo, e este é um lugar para poucos. O público que paga por um Petrus não quer ver o “Sr. Zé” da esquina consumindo o mesmo vinho que ele, ou o “influenciador ou artista que mal sabe o que é vinho, está falando do vinho replicando palavras que estavam escritas no aplicativo digital de vinho popular .

por Dayane Casal, Paris – 2023

Este público está num mercado específico e as estratégias para posicionar e manter um vinho lá não são nada fáceis e muitas vezes custam milhões e milhões de investimentos que os pobres mortais não fazem ideia. Um exemplo clássico é num jantar de negócios entre milionários e/ou bilionários para selar contratos entre as partes, é praxe fazer um brinde com o mais prestigioso vinho que houver, e nesta hora o que menos importa é o preço desta conta, pois o valor do vinho deve ter o mesmo status de prestigio, de autoridade, de glamour, de importância e de sofisticação do que está sendo selado.

Deixo uma última curiosidade sobre este fantástico vinho, o Petrus é o nome em latim para designar São Pedro, que era o nome da área onde está localizado o famoso vinhedo do Château Petrus. Pelo visto São Pedro também participou desta façanha econômica da marca Petrus.
Desejo boas provas com excelentes vinhos e saudações báquicas !

Fonte:

Mundo dos Vinhos por Dayane Casal