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Rio vai ganhar o melhor listening bar do Brasil em 2025

Falou alto leva pito, é a norma de um bar em Tóquio onde a treta impera. A qualidade do som e os coquetéis são coisa fina, mas a nota nos sites de avaliação é baixa. A causa do fenômeno está no modus operandi de Wataru Fukuyama, o temido proprietário, que até pede com certo carinho em placa na entrada: “Por favor, mantenha sua voz baixa”. Ai de quem passar batido. Um conhecido que lá esteve utilizou recursos mímicos para pedir um drinque. Ao menor sinal de animação, o Sr. Fukuyama é capaz de mandar grupos embora e desfilar insultos desclassificantes em sua língua materna. O Bar Martha, onde as estantes abraçam seis mil discos de vinil, é um autêntico listening bar. O conceito da música como prato principal, aliás, nasceu ali mesmo, na terra de Naruto (quem tem filho de 10 anos levanta o dedo).

Não é de hoje que os “bares de audição” prosperam pelo mundo afora, ideia que desembarcou no Brasil via São Paulo e busca um lugar à lua das noites cariocas. Nas versões tropicais, percebe-se como é tênue a fronteira entre o listening bar e a boate. Basta alguém largar a taça e jogar as mãos para o alto que inaugura-se o furdunço. O povo quer balançar, é justo. Mas listening, assim, listening mesmo é outra coisa. Globo espelhado e dose dupla de gim tônica certamente depõem contra a causa.

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Bar Martha: a discreta fachada em Tóquio da casa do temido Sr. FukuyamaInternet/Reprodução

A onda do som tridimensional

Em janeiro de 2024, há um exato verão, escrevi para a Veja Rio matéria sobre o início do fenômeno com a abertura do Celeste, o casarão centenário da Lapa que ganhou notável reforma acústica no segundo andar, esbanjando charme no ambiente bolado para a audição amparada em bons drinques (Frederico “Vian Cocktail Bar”) e petiscos (Lucio “Lilia” Vieira), entre caixas de som feitas à mão pela Core Sound System, que cuida de instalações sonoras em cidades como Paris e Londres. Na curadoria do DJ Nepal, as noites fervem de música boa, para citar apenas dois Marcelos que tocaram por lá nos últimos tempos: Da Lua e D2. Geral sacode e dá tudo certo. Merece uma salva de palmas a intensa movimentação cultural, de música e gastronomia que a turma do Lúcio e seus “Labutas” está levando ao Centro, historicamente abandonado pelos governos e políticas públicas.

Mas continuamos em busca do listening raiz. E a espera parece estar com os dias contados. O rolé que se anuncia larga em vantagem pelo contexto onde está inserido, parte de um complexo de louvação oriental construído por um sujeito que, se não nasceu no Japão, foi por acaso. Talvez em outra encarnação o restaurateur Menandro Rodrigues tenha visto olhos puxados ao se olhar no espelho. É o criador do Haru, que começou com 20 lugares em calçada de Copacabana e hoje tem capacidade para 100 pessoas, em quatro ambientes no antigo prédio com escada de mármore que serviu à loja de departamentos Sloper, nos anos 1950.

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Sabe aquela obra que vai ganhando corpo com boas ideias? Pois é. O que era para ser apenas uma confortável sala de espera de um restaurante que chega a receber mais de 200 pessoas nos melhores fins de semana abrirá em março de 2025 como um bar de audição único no Brasil – sem a fúria do Sr. Fukuyama, garante Menandro. O 111 terá auxílio de planejamento sonoro e curadoria do DJ e produtor Danny Dee, do Estúdio Rastro, e o DJ Memê. A marca finlandesa de equipamentos Genelec comprou a ideia e o objetivo é pensar no bar como um estúdio, levando aos clientes a depuração e a qualidade ouvida pelos produtores nos monitores de áudio em ambiente profissional. “Vamos promover uma imersão sonora, com tecnologia de som tridimensional”, conta Danny.

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Cores: o ambiente do listening bar com inauguração prevista para marçoReprodução/Divulgação

Comer, beber, ouvir

As ideias passam por noites musicais temáticas e audições específicas de álbuns com drinques do talentoso chefe de bar Leonardo Santos, enquanto quem ouve terá para divertir a boca beliscos como um mix de nuts e especiarias com torresminho de pele de curada de vermelho, o peixe; um tartare de tempero coreano com gergelins e crocante de alga nori; ou a mescla de cogumelos inspirada no chef Toshi Akuta, do Otoshi, de São Paulo, em molho cremoso e cobertos de farofa Panko. Em ponto próximo ao DJ, um “sweet spot” promete a melhor confluência de sons em mesa destacada, enquanto os hashis passearão por seleções de cinco ou seis peças de sashimis e sushis, a exemplo da vieira com manteiga clarificada e flor de sal, ou do piraúna com karasumi, a ova curada.

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Pedro Landim
Karasumi: a ova em cura japonesa sobre o piraúnaPedro Landim/Arquivo pessoal

A carta exclusiva do espaço terá coquetéis como o Karami Chuhi, um highball (alô, Japão) que passeia por diferentes pimentas e especiarias, feito à base de shoshu, o destilado japonês, com cordial White Penja Pepper, pimenta togarashi e água tônica. E o Wafu Negroni, uma pedida recomendável no Haru que vai de gim, vermute rosso e Campari com infusão de umeboshi e katsuobushi: toques salinos, de umami e defumados no clássico. Bons livros completam o panorama na estante abrangendo música, culinária, design, cinema… Enfim, acho que falei demais. Sou todo ouvidos.

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Fonte:

Comer & Beber – VEJA RIO