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Quantos restaurantes existiam à época da Independência? E hoje?

A Corte Portuguesa chegara ao Brasil fazia um punhado de anos e o Rio ainda era cidade fechada para o mundo, sem transporte, calçamento ou higiene. Comprava-se a carne-seca ao lado de onde se jogava o lixo, não havia saneamento algum e nos mercados de rua a céu aberto pairava um cheirinho de hortaliça vencida e peixe podre. Para piorar, não ajudava o fedor do óleo de baleia chamado de “azeite de iluminação”, usado nos lampiões de rua a partir do século XVI.

Mas o Rio, capital do Primeiro Reinado, crescia. 

Viajantes, profissionais liberais e a massa média trabalhadora com algum dinheiro tinha de comer. Além dos pratos de doces e salgados vendidos pela rua à toda aquela gente, a solução para a fome fora do lar era “tomar comida” das casas particulares ou “comer de pensão”.

Para os 79 mil habitantes urbanos, sendo apenas 46 mil livres, a vida nas ruas só acontecia à luz do dia e a principal refeição variava conforme a ocupação do dono da casa. Empregados públicos jantavam às 2 horas da tarde, depois de fechadas as repartições; o brasileiro tradicional comia ao meio-dia e o negociante, às 13 horas.

As confeitarias serviam doces e, de quebra, algumas refeições, mas o precursor daquilo que se convencionou chamar de restaurante eram as “casas de pasto”. Sim, locais para comer sem nome, nem nada. Sabia-se pela boca do povo ou vinham anunciadas em almanaques, jornais ou cartazes, com o simples endereço ou nome do proprietário.

Em 1809, o primeiro anúncio: “José Narciso, mestre cozinheiro, faz saber ao respeitável público que no Catete, junto à venda do Machado, se abriu uma nova casa de pasto, na qual dá mesa redonda a 800 réis cada pessoa. Quem a quiser separada para jantar, tem quarto fechado, havendo na dita casa boas massas, salsichas, e tudo mais com muito asseio”.

Vinte anos após a Independência, havia basicamente dois tipos de refeição: “pratos de colher” ou “pratos de garfo”. Adorei os nomes. 

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Os de colher vinham num recipiente único e o prato do dia podia ser um sarrabulho (ensopado de carne com miúdos e sangue de porco), um bacalhau com batatas, tripas, guisados, canjas ou angus de quitandeira. Já o prato de garfo era um menu a preço fixo, um pouco mais refinado e acompanhado de meia garrafa de vinho. 

E a cidade crescia e crescia, com bairros cada vez mais afastados do centro. Havia muito mais gente para comer, e ainda mais tarde: “Hoje, 8 do corrente, haverá no salão de café almoços de garfo, ostras e chocolate, assim como ceias frias; neste hotel acaba-se de contratar um perito cozinheiro. Também haverá limonadas, sodas e alguns jornais estran­geiros, franceses e ingleses”. Voilá! Começava a oferta das ceias frias, que prescindiam de uma cozinha aberta à noite e a iluminação a gás ajudava a empurrar para a frente os horários do almoço e do jantar.

Em 1844, o número de ‘casas de pasto na nossa cidade não chegava a dez. Hoje, conversando com Pedro Hermeto, Presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), soube que existem 35.000 restaurantes apenas na cidade do Rio de Janeiro.

“Sem termos a estatística, como conheceremos o Brasil?”, afirmavam os senadores do Império já na primeira sessão da legislatura, em 9 de maio de 1826. A frase era verdade, então e agora, mas o caminho até o primeiro Censo de 1872 foi tortuoso. Afinal, toda a informação está a serviço de quem a utiliza. Estariam tentando levantar o número de homens pobres livres para escravizá-los? Quem sabe, para aumentar impostos?

Em pleno recenseamento de 2022, com gente batendo à porta em busca de informações, sempre penso na dificuldade de se obter dados, a cada coluna que escrevo. Acreditem… foram muitos jornais de época e artigos acadêmicos para produzir essa meia dúzia de linhas com responsabilidade, seja para que alguém use numa conversa de botequim ou para pesquisas no segmento. 

Dados, melhor tê-los! E acendo uma vela, sempre que posso, para recenseadores e jornalistas.

A grande verdade é que, das dez casas de pasto dos tempos do Império aos 35 mil restaurantes de hoje, a informação ainda é a maior aliada da independência. 

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Fonte:

Comer & Beber – VEJA RIO