As civilizações da América pré-colombiana já consideravam o cacau um presente dos deuses 3 000 anos atrás. De lá para cá, a atividade de extrair o fruto de generosas árvores e convertê-lo no mais puro chocolate foi se aprimorando até chegar às atuais receitas que abastecerão o tão celebrado Domingo de Páscoa com altos teores de cacau. A onda de ovos mais escuros e intensos — um movimento que tem a ver com a busca por sabor e saúde ao mesmo tempo — se espalha pelas prateleiras de lojas que fazem seus produtos à base de métodos artesanais, empregando matéria-prima selecionada e com “denominação de origem” em teores de até 80%, e é também abraçada por gigantes do varejo como a Nestlé, que lançou seu Kit Kat na versão dark, e a Kopenhagen, com opção do clássico Língua de Gato mais amarguinho.
O fenômeno que agrada a tantos paladares é impulsionado pelo sucesso do modelo de fabricação conhecido como “bean to bar” (da amêndoa à barra, na tradução para o português) — ele acompanha toda a cadeia produtiva a fim de chegar a chocolates sem gorduras alternativas no lugar da manteiga de cacau, aromas artificiais, emulsificantes, corantes, espessantes ou qualquer outro ingrediente que subtraia da fórmula sua pureza. Nesse processo, o fruto e seu apreciado sabor ficam em destaque e todos os seus benefícios à saúde são potencializados. “A alta concentração de cacau apresenta mais polifenóis, como flavonoides e taninos, que contêm propriedades anti-inflamatórias, ajudam na prevenção de radicais livres e na proteção celular contra cânceres, doenças cardiovasculares e diabetes”, explica a nutricionista Suzana Bonumá, que trabalhou nas análises laboratoriais feitas com as amêndoas utilizadas pela Dengo.
Nos dias de hoje, o cardápio de barras e ovos conta com uma profusão de porcentuais de cacau, com escolha para todos os gostos. Na própria Dengo, marca que acumula prêmios e possui lojas em seis estados, a linha de Páscoa oferece cinco gradações de intensidade — de 36% a 70% de cacau. “Quem foca em qualidade e olha para o futuro precisa ter produtos à base de mais cacau no portfólio, com chocolates entre 50% e 60%”, aposta Estevan Sartorelli, CEO da Dengo. Outras grifes da valorosa iguaria enveredam por essa trilha. A empresária Patricia Landmann, que tem fazenda própria e amealhou prestigiados prêmios, abriu recentemente no Leblon a primeira loja fora de São Paulo da Chocolat du Jour. “A retomada das boas produções de cacau brasileiro valorizou o produto, e percebo que as pessoas estão mais abertas a experimentar sabor de maior intensidade”, afirma Patricia, que aporta nestas praias com um ovo contendo 80% de cacau.
A indústria define a porcentagem de cacau como a soma do peso de todos os derivados do fruto presentes no chocolate (como pasta e manteiga de cacau), dividida pela totalidade dos ingredientes daquela composição. No Brasil, a fração mínima necessária para um bombom, barra ou ovo ser rotulado como chocolate é de 25% — número baixo em relação à fração vista na Europa, onde a exigência é de 35%. É o que ajuda a garantir a qualidade dos famosos insumos belgas na fabricação, por exemplo, dos concorridos ovos da chocolateira Elizabeth Garber. Formada na Bélgica e vivendo no Rio desde os anos 1980, ela apresenta nesta coleção 2023 uma novidade com 70% de cacau especial de origem. “É um produto inserido dentro de uma cultura gourmet, para ser comido mais devagar”, recomenda Beth. Vale escutar as sábias palavras de quem entende e se lançar à degustação desta delícia sem medo de ser feliz.
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