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6 Vinhos Italianos Contemporâneos Que Contam as Histórias de Seus Terroirs

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No cenário enológico italiano, observa-se um renascimento das uvas autóctones, hoje consideradas herdeiras de uma tradição importante e também protagonistas de uma renovação estilística voltada para o futuro. O consumidor contemporâneo, na Itália e no exterior, busca vinhos com originalidade, com uma história para contar e com um perfil gustativo cativante, fresco, cheio de energia. Nesse contexto, a acidez pronunciada e a facilidade de beber se tornaram palavras de ordem, elementos-chave para interpretar aquilo que muitos definem como o “novo caminho” do vinho italiano.

Aqui estão seis nomes que incorporam essa revolução, uma verdadeira síntese entre tradição e inovação: Curtomartino, Feudo Maccari, Borgo Paglianetto, Lungarotti, Joacquin e Maugeri. Cada um desses produtores narra um território, uma filosofia produtiva e um amor pelas uvas locais, sem abrir mão, no entanto, de uma marca moderna.

O novo curso do vinho italiano e o valor do autóctone

A cena vinícola italiana possui uma riqueza varietal única no mundo: existem centenas de castas autóctones, muitas vezes pouco conhecidas fora de suas regiões de origem. Nas últimas décadas, a enologia abriu-se progressivamente às grandes variedades internacionais — Merlot, Cabernet Sauvignon, Chardonnay — e por um certo tempo prevaleceu a ideia de que, para competir em nível global, era necessário se conformar a esses padrões internacionais.

Hoje, contudo, observa-se uma inversão dessa tendência. Os produtores mais vanguardistas (ou talvez mais inteligentemente ligados à tradição) estão redescobrindo variedades antigas, apostando nas peculiaridades que tornam seus vinhos únicos. Isso significa aprofundar as características dos terroirs de origem, experimentar técnicas de vinificação que preservem acidez e fragrância, e propor ao mercado rótulos reconhecíveis e autênticos.

Essa mudança de perspectiva levou a priorizar o frescor e a elegância em detrimento de vinhos hiperconcentrados e excessivamente marcados pela madeira. Fala-se de “acidez pronunciada” para indicar aqueles perfis gustativos verticais, capazes de se prolongar no palato e deixar a boca limpa e pronta para o próximo gole. É uma característica que torna os vinhos mais versáteis (inclusive no universo vegano, onde as tendências culinárias favorecem ingredientes vegetais frescos e saborosos) e que encontra ressonância entre um público jovem e atento à qualidade.

Curtomartino – Selce e Terracava

Curtomartino é um nome que vem ganhando espaço entre os apreciadores de vinhos contemporâneos da Puglia. A vinícola se concentra em produções cuidadosas e na valorização da denominação Gioia del Colle DOC, buscando o equilíbrio perfeito entre o potencial do território e a vontade de oferecer vinhos que surpreendam por seu caráter e fineza.

Selce

Selce nasce da ideia de valorizar um possível corte de variedades brancas autóctones e/ou tradicionalmente cultivadas na Puglia (Fiano pugliese, Bombino Bianco ou Malvasia Bianca). Os solos, ricos em pedras e minerais, são capazes de exaltar o frescor e a salinidade do vinho. No nariz, percebe-se notas de flores brancas, cítricos e um leve toque de vegetação mediterrânea. Na boca, a acidez vibrante oferece um gole ágil e dinâmico, com final talcado e seco. Selce reflete plenamente a tendência dos brancos puglieses contemporâneos, que visam unir generosidade aromática e facilidade de beber.

Em geral, Selce é encontrado nas prateleiras entre 15 e 20 euros, posicionando-se como uma escolha de valor para quem busca um branco de qualidade, longe de excessos de peso. Embora relativamente novo no mercado, Selce já chamou a atenção de quem acompanha os vinhos de vanguarda da Puglia. É um exemplo de como a região não se resume apenas a tintos importantes, mas também pode expressar brancos modernos e atraentes.

Terracava

Terracava representa, por sua vez, a alma tinta da Curtomartino. Na Puglia, as uvas principais são Nero di Troia, Primitivo ou um blend de variedades locais. Neste caso, Terracava é 100% Primitivo, com uma abordagem leve. O nome “Terracava” remete à natureza profunda e calcária dos solos, que conferem estrutura e mineralidade ao vinho.

No olfato, há notas de frutas vermelhas maduras, ameixa e cereja, além de toques especiados e balsâmicos. A acidez, embora presente, está harmonizada com a maciez da fruta, criando um gole suculento e envolvente. Os taninos são finos e bem integrados, sinal de um trabalho cuidadoso tanto na vinha quanto na adega. Terracava se posiciona um pouco acima do Selce, com preços entre 25 e 30 euros nas prateleiras.

É considerado um tinto importante da Puglia contemporânea, uma referência para quem deseja descobrir vinhos regionais com estilo internacional, mas bem enraizados na tradição autóctone. Cada vez mais reconhecido por entusiastas e críticos, Terracava reflete uma visão moderna do tinto pugliese: potente, mas não pesado, rico em nuances e com um estilo mais ágil, graças à acidez equilibrada.

Feudo Maccari – Family & Friends

Vamos à Sicília, onde o Feudo Maccari, na zona de Noto, construiu uma reputação importante, especialmente pela valorização das castas autóctones. O Grillo, antigo branco siciliano, é uma uva que, nos últimos anos, tem feito muito sucesso, sobretudo entre aqueles que amam brancos com personalidade e potencial evolutivo.

Family & Friends é um branco feito com uvas Grillo, cultivadas na parte sudeste da ilha, onde os solos calcários e o clima quente, mas ventilado, ajudam a concentrar os aromas mantendo um belo frescor. No nariz, percebe-se a riqueza do Grillo, com notas cítricas, ervas aromáticas e um leve fundo de fruta exótica. Na boca, a acidez marcante dá tensão e envolvência ao gole, com um final limpo que facilita a bebilidade. É um branco que pode satisfazer até os paladares mais exigentes, graças à sua complexidade aromática.

Nas prateleiras, varia entre 35 e 45 euros, às vezes mais, dependendo da disponibilidade. O posicionamento em uma faixa médio-alta é coerente com a filosofia do Feudo Maccari, que busca qualidade excelente e uma interpretação autoral do Grillo. Family & Friends é considerado um pequeno clássico contemporâneo entre os brancos sicilianos. A marca da uva autóctone e a tensão ácida típica da nova enologia da ilha fazem desse rótulo uma referência entre entusiastas e colecionadores.

Borgo Paglianetto – Vertis

Vertis 2022 é a expressão mais refinada da Borgo Paglianetto, vinícola orgânica fundada em 2008 em Matelica, que hoje cultiva 29 hectares divididos entre linha base, reserva e cuvée exclusivamente em tanques de aço inox, reservando o uso de madeira apenas para o Montepulciano.

Vertis nasce de vinhas de vinte anos com exposição sul, em solos argilo-calcários, com colheita tardia e rendimentos controlados. Após prensagem suave e longa permanência em aço inox (15 meses mais 4 na garrafa), o vinho ganha corpo e precisão sem sacrificar o frescor.

Na safra de 2022 — a décima quinta colheita comemorativa, com 20.000 garrafas ao preço de cerca de 20 euros — o perfil é luminoso e vibrante: cítricos, feno, notas especiadas no nariz; boca densa, com glicerina, equilibrada por uma acidez vertical e um final salino. Reconhecido com os prêmios Tre Bicchieri e Top Wine 2025, Vertis encarna com rigor e modernidade a vocação do Verdicchio di Matelica.

Lungarotti – Torre di Giano

Torre di Giano “62” é um exemplo concreto do caminho estilístico de alívio empreendido pela Lungarotti, joia do vinho da Úmbria, que aposta em brancos mais enxutos, lineares, capazes de se expandir no palato sem perder identidade. Tudo começa na vinha: os fileiras mais ventiladas da propriedade de Torgiano, em solos argilosos e pedregosos, foram selecionadas para um Trebbiano de nervo cítrico e um Grechetto que dá volume sem pesar. Uma colheita antecipada ajuda a preservar acidez e tensão.

Na vinícola, trabalha-se exclusivamente com o mosto flor e adota-se um amadurecimento sobre borras finas bem mais longo que no passado, em baixa temperatura e com bâtonnage apenas sugerido. O resultado é um vinho com substância, mas sem perder linearidade: o centro da boca é redondo, mas o gole se estende verticalmente, terminando com uma trilha ácido-salgada precisa e limpa.

A embalagem reforça o mesmo propósito: uma garrafa de vidro verde antigo remete aos primeiros engarrafamentos da Lungarotti dos anos 1960, enquanto o rótulo histórico com a menção “Úmbria” e o relevo da Fontana Maggiore de Perugia reforça o vínculo com as raízes.

Na taça, o Torre di Giano 62 une a classicidade da denominação a uma pegada moderna, entregando um branco de perfil sutil, mas profundo, fresco, coerente e hoje mais que nunca fiel à visão territorial que o originou há mais de sessenta anos, com um preço de prateleira em torno de 15 euros.

Joacquin – Vino della Stella

A Campânia, e em particular a área da Irpinia, é famosa por seus brancos de grande profundidade. O Fiano é uma das castas mais representativas, capaz de produzir vinhos longevos, com aromas florais e uma marcante veia mineral. A Joacquin, com seu Vino della Stella, consolidou-se como produtora de uma interpretação refinada e inovadora da denominação. Estamos no coração da Irpinia, em áreas colinares com solos calcários, argilosos e vulcânicos. O Fiano encontra aqui sua terra de eleição.

O Vino della Stella apresenta sensações de flores brancas, cítricos, amêndoa fresca e toques de pedra de isqueiro. O paladar é sustentado por uma acidez marcante, que torna o gole longo e persistente.

O preço nas prateleiras é de cerca de 40 euros, refletindo o cuidado na seleção das uvas e a produção de nicho. Reconhecido por especialistas como um Fiano de referência, o Vino della Stella representa o equilíbrio entre potência e elegância, graças a uma acidez que o torna um branco “do amanhã”. Isso também o torna particularmente apreciado por quem preza um consumo atento à saúde e ao meio ambiente, já que o Fiano campano costuma ser vinificado com atenção à sustentabilidade ecológica.

Maugeri – Frontebosco

No Etna, um dos territórios mais fascinantes para a viticultura graças ao solo vulcânico e à altitude que permite a obtenção de vinhos únicos, nasce um vinho extremamente elegante e intenso. Maugeri Frontebosco é um branco feito de Carricante, a casta símbolo da vertente oriental do Etna. O Carricante é uma uva autóctone do Etna que dá origem a vinhos de acentuado frescor e grande longevidade. Os solos vulcânicos, ricos em minerais, influenciam o perfil gustativo, conferindo um tom salino, esfumaçado e cítrico.

Frontebosco se apresenta com aromas de cítricos amarelos, flores de giesta e delicadas nuances defumadas, típicas do terroir etneano. Na boca, a acidez vibrante é protagonista, acompanhada por uma salinidade que torna o gole envolvente. O final é longo, com toques quase salobros. Com um custo de prateleira entre 40 e 45 euros, Frontebosco representa uma combinação interessante entre alta qualidade e custo relativamente acessível, se comparado a outros brancos etneanos de faixa mais elevada.

Cada vez mais considerado um vinho-manifesto do novo curso do Etna bianco, Frontebosco é apreciado por sua identidade definida, sua facilidade de beber e o caráter vulcânico que o torna reconhecível e cheio de personalidade.

Pontos fortes

A análise dos pontos fortes evidencia como o posicionamento estratégico de alguns rótulos vinícolas italianos — cada vez mais icônicos, focados na identidade territorial, na valorização das uvas autóctones, na acidez e no frescor, ideais também para o crescente mercado vegano — se distingue por alta qualidade produtiva e forte narrativa ligada ao território de origem.

Contudo, apresentam pontos fracos ligados ao preço relativamente alto, à disponibilidade limitada e ao risco de que a forte acidez se torne apenas uma moda passageira. As oportunidades estão no aumento da atenção global à autenticidade e à sustentabilidade, no crescimento do enoturismo e nas harmonizações com a cozinha vegana. Em contrapartida, as ameaças incluem a concorrência internacional com estilos semelhantes, os efeitos negativos das mudanças climáticas e eventuais crises econômicas que poderiam levar os consumidores a preferirem vinhos mais baratos.

A nova enologia italiana está redescobrindo a força das uvas autóctones e da acidez como fatores-chave para propor vinhos distintos, longevos e alinhados com os gostos do mercado atual. As realidades aqui apresentadas — Curtomartino com Selce e Terracava, Feudo Maccari com o Grillo Family & Friends, Joacquin com seu Fiano Vino della Stella, Maugeri com um Carricante de raça em Frontebosco — testemunham a variedade e a riqueza do patrimônio vitivinícola italiano.

Apesar dos preços em faixa média-alta, tais vinhos justificam o valor graças ao cuidado artesanal na produção, à atenção obsessiva com a qualidade e a uma filosofia orientada pelo respeito ao terroir.

São considerados icônicos porque representam de modo eficaz a síntese entre passado e futuro: de um lado, a tradição centenária que moldou as vinhas e as uvas; de outro, a busca por um estilo ágil, fresco e moderno. Os vinhos do amanhã são exemplos de como a Itália pode se renovar sem trair a si mesma, olhando para o futuro com um legado de cultura, história e sabores que nenhum outro país pode reivindicar com a mesma intensidade.

* Cristina Mercuri é colaboradora da Forbes Itália.

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